Quando comecei a trabalhar no antigo INPS (hoje INSS), final dos anos 60, era responsável pelo cumprimento do orçamento, emissão de ordem de pagamento, pedidos de material, escala de férias do pessoal, correio etc. Era, como se diz, uma faz tudo.
A Agência era um caos. Nem faxineira havia. Eu limpava até o sanitário dos homens, pra não ficar sentindo aquele cheiro característico. Poucos servidores, muito trabalho, eu não sabia trabalhar direito, não havia quem me ensinasse, saía muita coisa errada, eu vivia sempre aflita naquela situação.
Se adoecesse um servidor, quem lá estivesse, sabendo o serviço, ou não, tinha o dever de cuidar daquele trabalho. Quando faltava o servidor que atendia o público, era um problema sério.
E acontecia muitas vezes. Eu, mais realista que o rei, apesar de não entender nada de benefício, não podia ver aquele povo ali sem atendimento, já que muitos vinham de longe e chegavam de madrugada para entrar na fila. Então, para não deixar aquela fila enorme esperando não sei até quando, avisava ao pessoal que eu sabia pouco do atendimento, mas ia tentar até que chegasse alguém. Os segurados, coitados, sem alternativa, aceitavam, esperavam, esperavam, na maior paciência (e ainda me agradeciam). E eu ia fazendo o que podia. E, naquele tempo, era tudo anotado em ficha. Computador? Só em Belo Horizonte, na Central. As fichas sumiam e eu procurava, procurava…
Um dia, repetida a ocorrência, eu sozinha naquela Agência, fui atendendo aquelas pessoas, até que chegou alguém para me substituir. Eu já estava num estado de nervo que não aguentava. Para me acalmar, peguei um “bolo” de barbante, todo emaranhado e comecei a desembaraçar devagar, como exercício.
Nisso, entrou um senhor para falar comigo. Eu pedi que ele se sentasse e esperasse um pouco. Ele sentou-se. Depois de um tempinho, parei, olhei pra ele e notei que havia desembaraçado um “bolo” de barbante. Já calma, deixei o exercício e disse: Pois não, senhor.
Ele notou minha surpresa e falou-me: “Cheguei aqui muito nervoso. Já tinha visto a senhora lá fora atendendo aquele povo. Esperei bastante. Entrei e vi que desembaraçava barbante. Como me pediu para esperar um pouco, deduzi que queria acalmar-se antes de me atender. Eu costumo fazer isso também. Por isso, resolvi segui-la na atividade. Sei que é um ótimo exercício”.
Ambos sorrimos, conversamos, resolvi o que ele precisava resolver e ele se foi agradecido. Passei o resto do dia em paz e creio que ele também.
Maria Francisca – Tarde de domingo de janeiro de 2019
Fatima Alencar
14 de abril de 2019 às 18:11
Lindas palavras às vezes temos que ter a paciência para não falarmos nem agir por impulso do momento.bjs adoro vc,amigo é coisa para se guardar do lado esquerdo do peito ?❤️??
mariafrancisca
22 de abril de 2019 às 20:13
Beijos, querida amiga. Obrigada pelo carinho.
Lucinete Lima
14 de abril de 2019 às 18:19
Lindas e sábias palavras. Gosto muito de ler seus livros.
Grande abraço.
mariafrancisca
22 de abril de 2019 às 20:12
Grata, Luciene.
Você é quase suspeita…rsrs.
Grande abraço.
Gláucio José Gomes
14 de abril de 2019 às 18:20
Eu também fui servidor de uma Agência do ex-INPS e tive alguns problemas, só que eu era fiscal (hoje auditor) e o trabalho era externo, mas as dificuldades muito semelhantes. Parabéns pelo relato fiel daquela época. Abr.
mariafrancisca
22 de abril de 2019 às 20:12
Grata, Dr. Glaúcio. Realmente, o trabalho do auditor era externo, mas convivia com essas agruras. Bem me lembro dos colegas que por lá passavam. Um abraço.
Ivete Flores Catta Preta Ramos
14 de abril de 2019 às 18:36
Bravo, minha confreira!Bom Lendo agora esta crônica,veio- me a reminiscência de vc relantando-me o fato com todos os detalhes no nosso último encontro,que por sinal foi bastante aprazível.Obrigada por ter regristrado aqui no blog para deleite de nós seus leitores.Beijos e sucesso sempre.Ivete Flores C.P.Ramos
Ps.: Desenrolar o barbante,excelente exercício de paciência.
mariafrancisca
22 de abril de 2019 às 20:11
Pois é. Precisamos nos encontrar para novos papos. Beijos.
Kawesa
14 de abril de 2019 às 20:26
Que bela lição! Grande aprendizagem para a sociedade impaciente que infelizmente hoje impera.
mariafrancisca
22 de abril de 2019 às 20:10
Grata, querida. Grande abraço.
Célia Moura
14 de abril de 2019 às 23:24
Sem paciência pra enfrentar esse governo sem paciência pra esperar que as coisas melhorem, não vejo solução,,,, bjs Francisca
mariafrancisca
22 de abril de 2019 às 20:09
Então, minha amiga, vá fazendo crochê, desenrolando barbante, fazendo alguma coisa, porque senão, fica maluca. Tá ruço, mesmo. Grande abraço. Obrigada pelo comentário.