OLHARES ENVIESADOS - Maria Francisca

 22 de abril de 2023 

 

Hoje, li um artigo de Júlio Pompeu, no site Terapia Política.

Dois empresários num bar. Um deles disse:

“-Pode chamar o sommelier?

-Eu sou o sommelier, senhor.

Não escondeu o olhar de surpresa. Olhou de alto a baixo, como quem avalia a carcaça da mercadoria em busca de defeitos e qualidades para avaliar se vale o preço. Entre indignação e resignação, concentrou-se na carta de vinhos.”

Realmente, o “Vale quanto pesa” ainda persiste. E não é só gente rica, empresário, que trata as pessoas assim, não.

Comigo já aconteceu esse tipo de coisas diversas vezes.

Um senhor que veio à minha casa, consertar o fogão. Atendi-o, mandei que entrasse, mostrei o fogão. Ele ficou por ali, olhou, olhou, depois, virou-se para mim e perguntou: Quem é a responsável? O senhor quer saber a dona da casa? Se for essa a pergunta, sou eu.

Ele fez tal qual o empresário. Olhou-me de cima a baixo e disse, com desdém: Você? Eu não me fiz de rogada. O senhor deve estar vendo novela demais. Só na televisão que as donas de casa ficam arrumadas, maquiadas e de sapato alto, viu, senhor? Ele abaixou a cabeça e não falou mais nada. Deu o orçamento, fez o trabalho, paguei e ele se foi.

Outra vez, na Academia de ginástica, um daqueles estagiários me perguntou, já sabendo a resposta, mas, de um jeito estranho: Francisca, você é juíza? Sim, por quê? Não parece.

Eu disse: Juiz tem cara diferente? Traz escrito na testa, ou eu teria que chegar aqui e nada falar com ninguém nem dar bom dia ou boa tarde? É porque eu brinco, converso? Estou errada? Por isso não pareço uma juíza?  Menino, você ainda precisa viver muito.

Falei e saí de perto dele.

Numa outra vez (e houve muitas mais) eu estava no TRT, acompanhando alunos de escolas. Eu ficava de pé. Combinava com eles que, durante a sessão do Pleno, eles se manifestassem apenas levantando o braço, que eu iria até eles, para explicar as dúvidas naquele momento. Então, via um braço levantado, ia perto, abaixava e conversava baixinho com o aluno. Alguns universitários, com é o costume, ali estavam, cumprindo uma parte do estágio.

Um deles me chamou, apontou um papel com suas anotações da sessão e me disse: Pegue a assinatura pra mim. Eu, calmamente, disse a ele. Quem pode fazer isso pra você é aquele rapaz que está na sessão. Ele com aquela prepotência que acomete alguns estudantes de Direito, que se sentem muito importantes, disse: E você, faz o quê, aqui?  Minha porção dia-bólica (como diz Boff) respondeu: Dê uma olhada ali na parede (onde estava minha foto) que você saberá. Os demais alunos riram e ele ficou muito sem graça.

Essas histórias repetem-se diariamente. E com pessoas diversas, em locais diversos. Sejam pessoalmente, sejam nas tais redes que de sociais nada têm.

Ainda mais, hoje, quando as “sensibilidades”, o ódio e as maldades estão à solta.

Muitos precisam tolerar olhares de desprezo, como o sommelier referido por Júlio Pompeu.

Comigo, não adianta olhar enviesado. Ainda tenho a minha respostinha na ponta da língua.

E os indefesos?

Maria Francisca – abril de 2023.

 

 

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2 comentários

  1. Bom dia Dra. Francisca. Excelente reflexão.

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Maria Francisca Lacerda
Poeta e escritora.
Espírito Santo - Brasil.


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