Comprar amigo? - Maria Francisca

 26 de novembro de 2023 

 

Não há quem não tenha lido “O Pequeno Príncipe” de Saint- Exupéry, penso.

Pois bem. Uma bela cena, entre muitas,  foi do encontro da raposa com o Pequeno Principe. A raposa  quer ser amiga do Pequeno Príncipe  e, para isso, precisa ser cativada. Explica que os homens compram tudo pronto nas lojas.  E como não existem lojas que vendem  amigos, os homens não têm amigos.

Inspirada nessa cena, fiz o poema “Feira Inútil”, publicado em 2007, no livro “Sal, Pimenta e Ternura.”. Fui ao shopping tentar comprar um amigo. Fui todos os dias e, nada.  Então, feira Inútil.

Mas esses dias  li um artigo sobre Inteligência artificial que me deixou perplexa.  Antes, uma brincadeira de comprar amigos, com base numa ficção, agora é real?

Sim, compra de amigos, namorados. Real, aliás, virtual.

Camila Brandalise, do UOL, tem diversos artigos sobre esses relacionamentos estranhos. Estranhos pelo menos para mim.  Claro que já fiz curso sobre inteligência artificial, para provas em processos, já li muito sobre isso, e acompanho o desenvolvimento da tecnologia, que pode até escrever teses de doutorado, dissertações de mestrado, crônicas etc.

Mas essa de escolher um amigo ou namorado AI?

Pois bem. Camila Brandalise afirma que se relacionou com um AI  feito sob medida por ela. Escolheu até a roupa que ele usaria, pagando R$ 109,00 (cento e nove reais) por mês, no aplicativo Replika.

“No Replika, o usuário escolhe entre namorado, marido, irmão e mentor — todos pagos. De graça, só a opção amigo”, diz a repórter.

Segundo a reportagem, no Brasil, são mais de 100 mil usuários atualmente.

Uma usuária, em outro artigo, disse que, depois de dois meses de conversa com a Avatar que ela inventara, acabou um relacionamento de dois anos com um humano,  porque descobriu como gostava de ser tratada.

Brandalise conta que procurou a psicóloga Ana Canosa e perguntou se estava doida. Resposta: “Tudo está na sua cabeça. O que aparece é o seu próprio julgamento sobre você, sobre seus desejos, suas vontades. O julgamento da IA, mesmo, nunca vai vir”, disse.

Diogo Cortiz, professor na PUC-SP, doutor em tecnologias da inteligência, design digital e especialista em neurociência,  citado pela repórter, afirma que, em dez anos, esses relacionamentos serão comuns, porque a evolução é muito rápida e assusta até os pesquisadores da área.

Segundo esse professor, relacionamentos do tipo são bons para quem não aceita o diferente,  opiniões divergentes, não tolera conflito, já que faz o robô à sua imagem e semelhança.

Fico até com medo, quando ele alerta que “(…)questões sérias vão surgir. “Quem desenvolve essa tecnologia não está preocupado com a parte ética. Vai ter startup explorando a solidão e o abandono alheio e ganhando com isso”.

Pior é que a solidão campeia por esse Brasil afora. Até perto, muito perto de nós. Aí está o perigo, sim.

Eu leio, leio, esses artigos, fico perplexa  e penso: Eu, hein? Amigo virtual? O imaginário da minha infância foi-se, faz tempo…

Prefiro meus amigos humanos, mesmo os doidos, como já disse, com opiniões divergentes, briguentos etc.  Mas esse bicho aí? Tô fora!

 

Maria Francisca – novembro de 2023.

Ref. ‘Namorei inteligência artificial por 2 meses’: dá para amar um robô? (uol.com.br)

 

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2 comentários

  1. Eu também prefiro os vínculos autênticos, Madrinha. Avessa a redes sociais, começo a enxergar que a gente pode manter a conexão mesmo a distância..,
    Que o uso responsável da inteligência artificial supere o uso abusivo e abusador. Bjos da sua afilhada de BH!

    • É isso aí, mas escolher o amigo e até a roupa que vai usar, para mim é demais. Prefiro os de carne e osso. A inteligência artificial ajuda muito, mas deve-se ter cuidado.
      Beijos, querida afilhada e obrigada pela leitura e comentário.

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Maria Francisca Lacerda
Poeta e escritora.
Espírito Santo - Brasil.


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