Olha isso aqui tá muito bom
Isso aqui tá bom demais
Olha, quem tá fora quer entrar
Mas quem tá dentro não sai. Pois é…
(Dominguinhos)
De repente, máscaras, álcool em gel, sabões e desinfetantes transformaram-se em bens de primeira necessidade.
Ordens dos novos tempos: Fique em casa! Use máscara! Lave as mãos! Mantenha distância!
Se você, idoso, resolve ir à esquina, porque precisa de um analgésico, há sempre alguém que lhe diz: Vai pra casa! Ou, desaforadamente: Vai pra casa, velho! Cuidado, implicância, ou medo?
Todos com medo de todos? Gente com medo de gente?
Na letra da música de Dominguinhos ninguém quer sair e todos querem entrar, porque está tudo muito bom. Só que não. Hoje, ninguém sai por medo e ninguém entra por medo. Está tudo muito ruim. Só a quietude do lar nos conforta.
Há algum tempo, escrevi uma crônica, que ainda não publiquei, sobre o uso de redes sociais, minha mais nova implicância, por considerar que todos vivem numa bolha e nem vêm o que se passa ao seu redor. Cada um por si. Por isso, apelidei a rede social de repelente de gente. “Estou conectado, não me incomode”, parece dizer.
Neste momento de pandemia, entretanto, as redes sociais, ao invés de bolha, ou repelente, ganharam status de ponte, por onde nos conectamos com o mundo ao redor, por absoluta impossibilidade do “olho no olho”.
As festas, as reuniões, as compras e muito tipo de trabalho estão sendo realizados dessa forma. Como fazer compra de mantimentos, como viajar, como reunir as pessoas?
As redes sociais fazem ponte, ainda, com a solidariedade. Pessoas arrecadam bens, materiais, alimentos e dinheiro para os necessitados. Ah se não fosse esse repelente elevado a ponte… Ponte sobre o caos…
Como realista esperançosa que sou (no dizer de Suassuna), espero um mundo em que não necessitemos de pontes movediças. Mas que os humanos sejam suas próprias pontes, para ir ao encontro do outro.
Na crônica “Recado ao Sr. 903”, Rubem Braga fala da reclamação do vizinho do 903 sobre barulho do 1003 (ele) e diz que tem razão. Não se conhecem e, portanto, estão reduzidos a números, ninguém procura ninguém e a vida só é tolerável, em ambiente assim, quando ninguém incomoda ninguém.
E arremata lindamente:
“Mas que me seja permitido sonhar com outra vida e outro mundo, em que um homem batesse à porta do outro e dissesse: Vizinho, são três horas da manhã e ouvi música em tua casa. Aqui estou. E o outro respondesse: Entra vizinho, e come do meu pão e bebe do meu vinho. Aqui estamos todos a bailar e cantar, pois descobrimos que a vida é curta e a lua é bela.
“(…) e os dois ficassem entre os amigos (…), entoando canções para agradecer a Deus o brilho das estrelas e o murmúrio da brisa nas árvores, e o dom da vida, e a amizade entre os humanos, e o amor e a paz.”
Maria Francisca – 29 de abril de 2020.
Edson lopes
23 de maio de 2020 às 15:17
Gosto demais de tudo que você escreve. Sou suspeito, pois,sou seu fã. Tenho essa Utopia de dias melhores…..quem sabe?
mariafrancisca
27 de maio de 2020 às 18:33
Teremos dias melhores, sim, Edson, com certeza. Obrigada por ser meu leitor assíduo e incentivador Grande abraço.
Handrey Renato Araújo Santos
23 de maio de 2020 às 17:56
Tia Chica, sou suspeito de tecer meus comentários, mas que coisa linda. A Senhora, sempre sábia, pega um desastre que estamos vivendo e transforma em uma crônica. Que coisa linda! Como é bom ter pessoas assim ao nosso lado. Muito gostoso ler suas crônicas. Venho aqui para pedir, que continue nos presenteando com suas histórias.
mariafrancisca
27 de maio de 2020 às 18:32
Meu querido sobrinho Handrey, você é suspeito, mesmo. Sobrinho amoroso e gentil, como você… Mesmo assim, agradeço. Beijos.
Ricardo Gueiros
23 de maio de 2020 às 18:46
Adorei essa: “Por isso, apelidei a rede social de repelente de gente. ´Estou conectado, não me incomode´.”
Isso mesmo. Há tempos, tomei uma decisão…e optei pela minha privacidade e, principalmente, liberdade. Alienado para alguns; livre para outros.
mariafrancisca
27 de maio de 2020 às 18:30
Ricardo, é isso mesmo. Para manter a nossa sanidade, muitas vezes temos que nos afastar de certas coisas. Obrigada, com saudades. Grande abraço.
Adib Salim
23 de maio de 2020 às 20:33
Maria Francisca, gostei muito! Uma ótima reflexão sobre os dias de hoje. Também carrego a mesma esperança realista declarada por você!
mariafrancisca
27 de maio de 2020 às 18:29
Adib, somos realistas esperançosos e não é de hoje, né? Grande abraço.
Regina Lúcia
24 de maio de 2020 às 18:06
Boa noite, amiga
Bela e real crônica.A Pandemia nos afastou e também nos aproximou.Ainda bem que podemos viajar nas asas da Poesia, Textos Poéticos, etc.sem sermos contagiados pelo Coronavírus.Boa noite sem Pandemia! Beijos Online!
mariafrancisca
27 de maio de 2020 às 18:28
Querida amiga Regina, a poesia é nossa válvula de escape. Obrigada pelo carinho. Beijos.
valsema Rodrigues
24 de maio de 2020 às 20:27
parabéns, querida francisca… Cronica linda e verdadeira
Éramos todos humanos, mas a religiao nos separou; a politica nos dividiu; o dinheiro nos classificou; o Virus covid19 nos igualou…Estamos juntos no mesmo caos…sobre a mesma ponte….Mas com esperança-Vai passar! Fiquem em casa… bjs valsema- 24-5-2020
mariafrancisca
27 de maio de 2020 às 18:26
Pois é, querida Valsema, tudo foi mudando e nós nem vimos. Só nos demos conta, quando o caos se aproximou. Com esperança venceremos, sim, se Deus quiser. Obrigada. Bjs.
Tariane Vitória Campos Lopes
25 de maio de 2020 às 20:38
Sempre impecável! Saudades tia.
mariafrancisca
27 de maio de 2020 às 18:24
Obrigada, Tatá. Saudades também querida. Bjs.