Maria Francisca - Blog da Maria Francisca Lacerda, escritora e poeta. - page 9

 15 de outubro de 2019 

Meu riso fácil costuma atrair piadistas. Claro, sou uma boa cliente. Rio de tudo. Acho que sou a única pessoa que ainda ri de Renato Aragão. Mas não me venha com piadas “sujas”, que ofendem pessoas. Aí, fecho a cara. Nesse caso, quem fica engraçada sou eu, como dizem meus amigos.
Neste mês, estive em Santa Catarina, mais especificamente em Balneário de Camboriú, para um evento. Lá encontrei muitos amigos, abraços, carinho, lembranças e andanças pela cidade, não tanto porque a chuva não dava trégua.
E encontrei minha amiga Marama Carneiro. Resolvemos andar, com chuva mesmo. Aonde ir? Claro que num shopping qualquer, andar pelas lojas, ver coisas, na esperança de serem diferentes de outros shoppings.
Tomamos um “UBER” e lá fomos nós. Começamos nossa diversão com os papos do motorista. Falava sem parar. Contou da família, entrava em nossa conversa, dava palpite… Depois, começou a reclamar do aplicativo que mandava entrar em rua tal e tal: Ele está me mandando entrar por aqui, mas não vou, de jeito nenhum, senão vou ter que dar uma volta enorme. E, agora, me manda passar ali, não vou, não vou. Eu ria e Marama dava corda: não vá, não. Esse aplicativo está atrapalhando o senhor. E assim fomos rindo até o shopping.
Andamos, andamos, vimos as lojas e suas mercadorias, compramos sombrinha, subimos e descemos escada rolante como crianças, rindo de tudo, até que resolvemos tomar um café.
Chegamos numa lanchonete pegamos o cardápio. Vimos, “café com casquinha e chocolate”. Os olhos encheram-se na mesma hora: novidade! Vamos experimentar.
As xícaras chegaram. Achamos uma beleza e resolvemos fazer um brinde para uma foto, claro, como não registrar um momento desses?
Chamamos a atendente para o registro. Levantei a minha xícara, mas, ai, quando Marama pegou a dela, a asinha desmanchou-se, e foi-se o café, o chocolate e tudo pela mesa. Não imaginamos que a casquinha, com o quente do café, iria derreter-se.
Era uma casquinha como de sorvete. Comestível. Eu sempre adorei sorvete de casquinha. Aliás, mais da casquinha do que do sorvete.
Apareceram, daí a pouco, outros amigos, sugerimos aquele café e todos aderiram com gosto.
Rimos do incidente, mas não desistimos da foto que ficou registrada como o dia em que tomamos o café e comemos a xícara.
E foi uma delícia.

Maria Francisca – setembro de 2019.

 29 de setembro de 2019 

Assis Chateaubriand, segundo Fernando Morais (in Chatô: Rei do Brasil) costumava publicar diariamente um artigo em todos os seus jornais.
Um dia, chegando a Belo Horizonte, escreveu no hotel, e, a caminho de um evento, passou na redação, deixou o escrito para que o linotipista decifrasse seus garranchos, de forma a possibilitar a publicação.
Quando retornou ao hotel, assustou-se, pois encontrou parte do rascunho num dos bolsos, cerca de um terço do que escrevera. Ficou aflito e, logo de manhã, pediu a um mensageiro para buscar numa banca próxima um exemplar do seu jornal, preocupado com o que tivesse saído, ou não saído nada. Ambos os fatos eram preocupantes.
O artigo estava lá, completo. Saiu danado da vida, foi ao jornal, xingou o linotipista de tudo quanto é nome feio, antes de despedi-lo, ao argumento de que tivera a ousadia de escrever um pedaço do artigo assinado por ele, o dono do jornal.
O rapaz tentou explicar, mas nada o demoveu.
Passada a tempestade, acalmou-se e foi ler o artigo, confrontando-o com o que escrevera. Estava tal e qual. Nenhuma palavra, letra, ponto ou vírgula, diferentes do que estava em seu rascunho.
O resto não precisa ser contado. Todos já imaginam.
Relembro essa história, porque nunca me esqueci de um fato parecido que aconteceu comigo.
Trabalhava em Linhares. Naquele tempo, escrevia à mão e a secretaria datilografava tudo. Eu não tinha a habilidade de meu irmão, também juiz, de escrever direto na máquina, de forma a entregar as sentenças prontas.
Como eu ficava em Linhares a semana inteira, e morava num micro apartamento na parte de trás da secretaria, ao lado do gabinete, trabalhava até a hora de dormir e ia empilhando processos e mais processos nas cadeiras para, dia seguinte, serem datilografados os textos das decisões.
Um dia, quando o trabalho retornou, como de praxe, fui conferindo e assinando. Deparei-me, entretanto, com uma decisão de embargos à execução, cujo rascunho não encontrei e, pior, não me lembrava de ter lido a matéria daqueles autos. E eu tinha uma memória excelente. Li todo o processo, vi que a decisão estava correta, mas o fato de não me lembrar do caso, tampouco encontrar o rascunho, me deixou curiosa, pra não dizer aflita: como e por que não me lembrar?
Chamei o diretor de secretaria e perguntei: Cadê o rascunho dessa decisão? Ele, timidamente, disse: Dra., eu tomei a liberdade de fazer essa minuta, mas peço desculpas pela minha ousadia. Não deve estar boa.
Menino, está igualzinho ao meu estilo… Como, em tão pouco tempo, você assimilou isso? Ficou ótima.
E ele nem tinha terminado o curso de Direito.
Eu não sou nem pretendia ser um centésimo do que foi Chateaubriand, por isso, não fiz, nem faria como ele., claro, mesmo porque, a minha primeira atitude foi ler o processo. Aliás, e iria imaginar que não fora eu a autora daquela decisão? E estava ótima.
Marcos Louzada era um excelente servidor e isso ficou constatado nos longos anos que trabalhamos juntos, até minha aposentadoria.
Hoje, quando me lembro daquela decisão tão bem-feita, com uma pontinha de inveja e de saudade, digo em pensamento:
Não fui eu…
Maria Francisca – final de setembro de 2019.

   Causo | Comente »   
 25 de setembro de 2019 

Gente que vem, gente que vai
Ladeira acima, ladeira abaixo
Ladeira de pedras, ladeira de asfalto
Carro passa, gente passa
Depressa, passo a passo.
De qualquer jeito, de qualquer arte
Respiração suspensa, quase morte.

No alto, fim de pedras, fim de asfalto
Falta força, falta fala, falta gala
Sobra fé, sobra reza, sobra terra, sobra guerra
Pra chegar ao cume, ao lume
E ver de perto o Convento
E tudo que tem dentro,
Minha gente.

De lá, vê-se o céu, vê-se o mar
Os navios a singrar.
Da penha de Vila Velha,
Vê-se o mundo.

E dá uma saudade…

 15 de setembro de 2019 

Hoje, 21.07.2019, a Folha de São Paulo publicou uma notícia com a manchete: “Processo leva 63 anos para ser julgado no STF, e até advogados já morreram”. O intuito do autor era ser reconhecido filho de José Cândido de Almeida, morto sem deixar descendentes reconhecidos e, assim, ter direito à herança. Não imaginava a via crucis que teria que passar. O processo chegou ao fim, com a vitória do autor, que, se tiver vivo, terá 87 anos. Os advogados já morreram, segundo a reportagem.
Por isso, ir à justiça cobrar algum direito virou piada. “Vai. Teus bisnetos receberão o direito que pleiteias. Se receberem”. Dirá.
Já me perguntei diversas vezes, diante de situações desse tipo: que direito é esse? E cada dia surgem mais casos e, pior, perto de nós.
Uma amiga falou-me, recentemente, sobre um inventário de sua família, ajuizado há 17 anos, dezessete anos, nem acredito, até hoje sem sentenciar. Caso simples: o falecido deixou três terrenos. São três filhos. Já está resolvido entre eles: um terreno para cada um. Se fosse hoje, nem precisaria dessa ação. Faria em cartório. Maiores todos, de comum acordo sobre os bens…Não se sabe o motivo de tanta demora, mesmo porque nem controvérsia há.
Na maioria dos casos, se há controvérsia, quem pode pagar advogado procrastina o processo até não poder mais. Primeiro grau, Tribunal, TST, STJ, STF, retorna, retorna, retorna…Pobre é sempre pobre. Em qualquer área do Direito. Não vemos todos os dias alguém pagar fiança e responder em liberdade? E quem não tem dinheiro vai para a prisão e lá fica esquecido, se não tiver um filho de Deus que o descubra preso e o ajude.
Mas como diz a música, o pensamento é uma canoa, lembrei-me de um caso ocorrido no TRT-ES, que durou 25 anos.
Posso contar à vontade, porque está no livro “20 anos de Trabalho”, em comemoração aos 20 anos do TRT do Espírito Santo.
Tratava-se de uma invenção de um empregado da antiga Vale do Rio Doce. A ação foi ajuizada em 1986. Ele reivindicava o direito de autoria e queria receber metade do proveito que a empresa pretensamente teve com seu invento. A Vale não concordava, claro. Não havendo acordo, as provas necessárias foram realizadas. A perícia durou muito tempo e contou com 92 quesitos do empregado e 92 da empresa. A sentença só foi proferida em 1999, ou seja, 13 anos depois.
Aí, recomeçaram as idas e vindas. Recursos e mais recursos. Até a incompetência da Justiça do Trabalho foi invocada e rejeitada. Só em 2011, o inventor conseguiu receber seu dinheiro, depois do último recurso ao STF e após refeitos todos cálculos.
Lembrei-me desse processo, por 3 motivos. O primeiro deles, porque foi muito difícil e demorado, mas houve mais duas situações pelo menos interessantes.
Princípio de 2005. Eu presidia a sessão no Plenário. O secretário da Presidência chegou lá apressado e me disse que havia um senhor fantasiado de palhaço na porta do prédio do TRT. Por quê? Ele não sabia dizer. Pedi para chamar aquele senhor para falar comigo. Ele não estava mais lá, disseram. Ficara com medo e fugira.
Pedi para fazer contato com ele. Chamei-o para uma conversa. Expliquei sobre a tramitação do processo, dos recursos, dos prazos. Ele agradeceu e saiu, mas fiquei frustrada e, por que não dizer, com muita vergonha.
Por fim, saiu o dinheiro. Em 2011. Vinte e cinco anos depois do ajuizamento. Não é que a ex-mulher do reclamante conseguiu atrasar mais um pouco? Entrou na Justiça, postulando metade do dinheiro… e levou.
Depois de tanto tempo, o inventor acabou por ficar com uma das mãos abanando…
Assim caminha nossa Justiça. Justiça? Tenho dúvidas.

 

Maria Francisca – julho de 2019.

 17 de agosto de 2019 

Hoje, dia do escritor (25/07) lembrei-me de muitos e, principalmente dos que se foram, ficando imortais com seus escritos. Um dos meus preferidos, Drummond, está eternizado não só em poemas, crônicas e contos, mas na praia de Copacabana, sentado num banco, de óculos, pensativo, como costumava ser.
E recebe muitos visitantes que passam horas ali na Av. Atlântica, em sua companhia, tirando fotos e mais fotos e alguns parecem conversar com ele.
Eu tenho belas fotos sentada ao lado dele e adoro olhá-las.
A estátua fica quietinha, esperando as pessoas, talvez tentando se redimir do silêncio anterior já que, por ser muito tímido, não era de muito papo, tampouco de fotografias ou de entrevistas. Então acolhe os visitantes e aceita todo tipo de exposição.
Pena que nunca puxei conversa, porque ficava tímida perto daquele grande poeta.
Mas Ruy Castro garante que testemunhou inúmeros colóquios de visitantes com ele. Um chega cedinho e o diálogo é muito importante, a julgar pelos gestos. Às vezes, encosta-se na estátua, como se estivesse falando baixo ou tentando ouvir o que Drummond estaria dizendo. Será que ele respondia? Outro vai ao fim do dia, levando agasalho e guarda-chuva para protegê-lo dos dias frios ou chuvosos. E fica ali grande tempo, cuidando dele. Outros vão lá só para roubar os óculos do coitado que, já velhinho, não consegue reagir.
Aí, a curiosidade toma lugar: o que será que conversavam?
Ah, se eu soubesse disso antes! Teria tentado uma conversa. E a primeira coisa seria um pedido de desculpas. Sim, porque a primeira vez que ouvi o poema “No meio do Caminho” morri de rir. Coisa mais sem pé nem cabeça, pensei. Aliás, todos que se encontravam no teatro Santa Clara, riram. Foi uma gargalhada geral. Todos jovens, ora.
Eu não sabia nada de nada, nem conhecia a história do poema, mas poderia ser desculpada pelo Drummond, porque o poema, em verdade, sofreu sérias críticas de especialistas, pela repetição, principalmente.
Depois, pouco a pouco, conheci grande parte de sua obra, e tomei-me de amores por ele. Li e reli seu poema, publicado logo depois do falecimento de seu filho, 1928, na Revista de Antropofagia. Eu nunca poderia imaginar. Essa era a pedra no seu caminho, o sofrimento por que passara. Com o poema ele processou esse acontecimento triste em sua vida, dizem os analistas.
Se pudesse, outra conversa que teria com ele seria sobre o poema “Para sempre”, maravilhoso, singular, publicado em 1965, cujos versos finais nunca esqueço, porque além de belos, são verdadeiros: “Mãe não morre nunca, mãe ficará sempre junto de seu filho e ele, velho embora, será pequenino feito grão de milho”.
E a canção que (…) “faça acordar os homens e adormecer as crianças?” E o poema que cito sem parar, talvez para servir de incentivo a mim mesma: (…) “prefeririam (os delicados) morrer. Chegou um tempo em que não adianta morrer. Chegou um tempo em que a vida é uma ordem. A vida apenas, sem mistificação”. Em “Os ombros suportam o mundo.
E crônicas? Falaria apenas de uma pra não encompridar muito o papo: “A menininha e o gerente”. No final, a menininha fez o gerente sentir saudade da filha. Sinto a saudade junto com o gerente todas as vezes que leio a crônica. E fico emocionada.
Teria muito mais coisa para conversar com ele. Mas só se ficasse ali grande tempo. Os visitantes costumeiros deixariam? Os que cuidam do frio e da chuva?
Por fim, pelo menos mais um poema eu lembraria antes de desocupar o canto.
Já citei esses versos até em sentença, tratando da terceirização. “João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém. João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento, Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia, Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes que não tinha entrado na história.”. O nome do poema: “Quadrilha” (sem trocadilho, por favor).
É, Drummond, perto de minha mãe e de sua obra, sou um grão de milho.
Maria Francisca – 25 de julho de 2019.

 19 de julho de 2019 

Na novela da Rede Globo, “Chocolate com Pimenta”, transmitida anos atrás, havia uma personagem com mania de grandeza. Achava-se superior e, por isso, vivia repetindo: Sou chique, Bem!

Esse bordão caiu no gosto popular e há sempre alguém repetindo isso por brincadeira, porque, em verdade, era muito engraçado, em face do contexto, já que a moça em questão nem era pessoa importante, tampouco chique.

Ouvi esse bordão esses dias e lembrei-me de situações engraçadas que, embora os autores não verbalizassem o termo, queriam dizer a mesma coisa, como se fosse um deboche para com pessoas próximas.

Na minha Terra Natal, nos anos 60, era comum as pessoas procurarem trabalho em São Paulo. Sejam empregadas domésticas, sejam trabalhadores rurais, ou qualquer outro trabalhador que não estivesse encontrando trabalho e sustento na sua cidade. E muitos vinham passar férias com suas famílias, trazendo presentes, alegria, o que era muito bom, e aquele sotaque carregado do paulistano que faziam questão de exibir como um troféu. Era muito engraçado vê-los falando deforma diferente.

Pois bem. Joana, trabalhadora doméstica, fez esse percurso e deixou a filha com a mãe, nossa vizinha, uma mulher excelente, simples, quase analfabeta, nossa amiga. A menina tinha a idade da minha irmã e as duas brincavam juntas.

Um dia, a Joana veio de férias e, numa tarde, começou uma chuva fina, bem fina e a filha estava brincando do lado de fora. Joana, então, numa casa da frente, conversando, viu a filha na chuva e gritou de lá para a mãe: Mãããiiiêê! Chame a Martinha pra dentro, está garoandôôô… A mãe: O quê, Juana? Está garoandôôô! O quê, Juana? Está garoandôôô! O quê, Juana? Está chovendo, ora! Enraiveceu-se a “Juana”.

Nós, ali perto, rimos a valer.

Alguns anos depois, chegou a vez de pessoas migrarem para os Estados Unidos. Da mesma forma, retornam bonitos, alegres, contando tantas vantagens que chegamos a pensar que não passaram perrengue algum por lá. Como os pseudo paulistas, adquiriam um pouco de conhecimento do Inglês e gostavam de exibi-lo. Aí, acabavam sendo protagonistas de situações engraçadas, como a “Juana”.

Muitas pessoas de minha relação pessoal fizeram essa experiência, mas uma delas fez-me rir. Ficou lá uns três anos e retornou pensando que era americana, achando-se o máximo, ou seja, “a dona da cocada”, debochando dos brasileiros e falando mal do Brasil, como é comum acontecer.

Um dia, num grupo de pessoas conversando, perguntaram-lhe se era ela quem levava o neto pequeno para a aula. Ela disse: Não. Ele vai de Veen, para em seguida, dizer: Van, como dizem vocês, naquele tom caraterístico.

As pessoas presentes fizeram simplesmente um “ah” eu, na mesma hora, lembrei-me da “Juana”, com seu “garoandôôô”.

Hoje, em todos os lugares, e até em redes sociais, nas discussões, sempre aparece um mais inteligente e mais culto do que os outros, e até o próprio dono da verdade. São os egos em ebulição.

Eu só faço rir, quando vejo ou ouço essas coisas, lembro-me da expressão e tenho vontade de dizer ao “pavão”: Sou chique, Bem!

Maria Francisca – julho de 2019.

 9 de julho de 2019 

Leozinho tem sete anos. Estuda o 3º ano do Ensino Fundamental.   Vejam como escreveu:

Um cachorro foi resgatado pela PM no Morro da Piedade em Vitória no dia 09 deste mês.
A PM foi cumprir um mandado de busca e apreensão e encontrou o cachorro.
O animal não era alimentado, sofria maus tratos e vivia acorrentado.
Os suspeitos estão foragidos e o nome deles não foi divulgado até o fechamento desta edição.

 23 de junho de 2019 

Amigos, fui dar uma arrumada no blog e, sem querer, limpei diversos comentários. Alguns ainda sem minha resposta. Peço desculpas . Um abraço a todos.

 11 de junho de 2019 

Meus netos pequenos sempre gostaram de brincar na banheira. Gabriel e Daniel, muito amigos, hoje rapazinhos, jogavam água pra todo lado e eu comprei uma seringa daquelas grandes, de plástico, descartáveis, para desafios. Um jogava água no outro e adoravam. Um dia, a seringa sumiu. Procurei, procurei e, então, perguntei a eles: Cadê a seringa? Um olhou pro outro (já vi que havia coisa errada) e o mais velho disse: Dani jogou pela janela. De imediato, Dani disse, apontando o dedo para o Gabriel, enfático: CULPA SUA!
Lembro-me dessa história e penso ser uma atitude natural de defesa atribuir a outrem, num primeiro impulso, algo errado ou inadequado que fazemos ou que nos acontece.
Outro dia, andando pelo centro de Vila Velha, tropecei, e um “engraçadinho” logo disse: “Levante o pezinho”… Claro, se ele não dissesse isso, eu já ia dizer que a culpa era do buraco, como já disse Leandro Karnal: Até quando tropeçamos, atribuímos nosso percalço ao piso irregular.
Como já aprendi a lição, não digo mais que é culpa da “calçada cidadã”, quando dou de cara com um poste e saio com braço e pernas ensanguentados, mesmo numa beira de calçada toda quebrada. Tropecei e quase caí, porque estava olhando para uma moto e me distraí.
E se não temos as coisas, culpa do Estado, porque o hábito de querer tudo fácil está em nós. Ora, tão bom quando os bens de que precisamos está ao nosso alcance, sem esforço, não? De preferência, quando vem do Poder Público. Pagamos imposto, ora. A eterna mania.
Lembro minha infância no Curso Primário, correspondente, hoje, à primeira parte do Ensino Fundamental. Os alunos compravam uniformes, livros, cadernos etc. Somente os muito pobres, quase miseráveis, é que ganhavam a merenda (palavra hoje fora de moda, substituída por lanche). Eu tinha muitos colegas nessa situação. Eu era pobre, mas não miserável. Então, meus pais compravam tudo.
Hoje, em escola pública, alunos ganham uniforme, material e lanche.
Há pouco tempo, no trabalho voluntário que realizava nas escolas, acompanhava alunos a uma visita ao TRT e vi que não estavam com a camisa do programa. Questionada, a professora disse que não havia recebido o fardo com o material (e não havia, mesmo). A Escola também não recebeu os uniformes. Mas muitos meninos usavam camisa de marca e celular de última geração. Podiam comprar camisas caras e celulares, mas o uniforme o governo tem que dar. Não tinham uniforme por culpa do Governo Municipal.
E a enchente? Vila Velha sofreu, em maio, com uma chuva torrencial e demorada, com alagamentos terríveis em diversos bairros, principalmente em Cobilândia, onde até o hospital é vulnerável e os pacientes tiveram que ser retirados às pressas.
Criticamos as autoridades, claro, elas têm sua parcela de responsabilidade. Inclusive, há pedido de investigação ao Ministério Público, mas devemos pensar na nossa quota de culpa.
Praia da Costa e Itapoã foram bairros que ficaram debaixo d’água em diversos pontos.
Façamos nosso exame de consciência.
O lixo jogado em locais inadequados é culpa do poder público? A sujeira que os lindos cachorrinhos fazem nas calçadas e nas ruas é culpa do poder público? O lixo no valão é culpa do poder público? Até sofá jogam no valão… Quem jogou foi o Prefeito? Quando os bueiros entopem, quando a maré sobe trazendo sujeiras e mais sujeiras, a culpa é de todos nós, que não cuidamos da casa onde moramos.
É só passar bem cedo, na segunda feira, pelo calçadão, que se vê a quantidade de lixo nas calçadas, na areia da praia e até cocô de cachorro, apesar do brado de alguns voluntários, na areia, aos domingos, pedindo às pessoas para recolherem seu lixo.
Como diz Leonardo Boff, o homem continua acreditando que é o centro do universo e que o conjunto de seres da natureza somente possui razão de existir na medida em que serve ao ser humano, que pode dispor deles ao seu bel-prazer.
E assim vamos caminhando, porque não tenho que me responsabilizar por nada. Nem pelos percalços da vida.
Agora, se você não gostar do que escrevi, CULPA SUA!

Maria Francisca – Junho de 2019.

   Crônicas | Comente »   
 31 de maio de 2019 

Rubem Alves afirmou, certa vez, que fomos educados para ser ferramentas. E tem razão. Não se pode simplesmente ficar sem fazer nada. Quando pedi aposentadoria, muitos me perguntavam: O que você vai fazer quando aposentar-se? Nada, claro, eu respondia, para espanto das pessoas. Aposentou-se tão cedo! Por quê? Quando não pensam que estamos doentes e passam a dúvida pra frente: Será que está doente?
Agora me perguntam: Tem viajado muito? Não, não tenho viajado. Por quê? Às vezes respondo: Porque não tive vontade ou por pura preguiça. E sempre causo espanto. Nossa, seu filho mora na França e você ainda não foi lá? Aproveite…Dizem.
É que, se não estivermos trabalhando, temos que viajar, dançar, ir a festas, em suma, badalar e, de preferência, postar tudo muito bonito nas redes sociais. Ninguém lembra que podemos ter outros interesses, como um trabalho social, escrever, ler, ou, simplesmente, ficar em casa sem fazer nada ou fazendo algum serviço doméstico. Se alguém disser que não está fazendo nada, Deus me livre! É um espanto só.
Esses dias, conversava com uma amiga que estava em férias. Ela disse: Optamos por ficar por aqui, mesmo. Estávamos cansados, com pouco dinheiro...Eu disse: Olhe, às vezes você descansa muito mais ficando em casa, do que viajando. E viajar nas férias virou obrigação. Tudo que vira obrigação deixa de ser lazer.
Hoje, a palavra de ordem é “qualidade de vida”. Temos que ter qualidade de vida, de qualquer jeito. E isso vem a ser o quê?
Um amigo contou-me que fez um curso na empresa onde trabalha e que a facilitadora foi separando os grupos: quem tinha algum hobby, quem praticava esporte, quem fazia exercício físico. Ao fim, sobraram três, ao que um deles perguntou: Não vai ter um grupo de quem gosta de ficar à frente da TV vendo jogo de futebol e comendo batatas fritas, não? E, diante da cara de espanto de uns e das gargalhadas de outros, emendou: Já joguei futebol, fui mergulhador, nadador, lutador de judô…Em suma: já fiz isso tudo. Agora, não faço mais. Decidi dedicar-me à minha carreira. Gosto do meu trabalho, trabalho muito, chego cansado e quero ver meu futebol na TV e comer minhas batatas. É pecado? Não sou um workaholic, mas worklovers. A facilitadora sacou o plano B de script, desconversou, e levou o grupo para uma atividade lúdica.
Claro que devemos cuidar do nosso corpo e de nossa saúde. Como disse o Padre Helder, o nosso corpo pede espaço, tempo, atenção, alimento e, sobretudo, nos pede descanso e bem-estar, inspiração e contemplação. Mas tudo depende de cada um. Das escolhas. E nenhum de nós pode saber o desejo do outro, o interesse que cada atividade ou ação desperta nas pessoas que nos cercam. Seja de quem escolhe ficar em casa nas férias, sem fazer nada, seja de quem quer “badalar” por aí, viajar ou internar-se numa mata, fazer retiro ou coisa que o valha. Não por estar na moda, mas porque avaliou e conhece suas vontades e necessidades.
O Eclesiastes já nos dá a lição de que há um tempo para tudo debaixo do sol. Tempo de plantar, tempo de colher, tempo de guerra e tempo de paz, tempo de falar, tempo de calar.
Eu fui aprendendo a viver segundo meus desejos e minhas necessidades, sem me preocupar com a ferramenta, porque se fosse pensar nisso, aposentadoria, nunca. Nunca, não. Há a expulsória…
Penso, sigo, passo.
Cedo espaço
Pros que hão de vir.

Maria Francisca – maio de 2019.




Maria Francisca Lacerda
Poeta e escritora.
Espírito Santo - Brasil.


Receba nossas novidades:

Arquivos por mês:



Blog da Maria Francisca ©.
Design por M.S. Netto