NADA COMO UM ARCO-IRIS - Maria Francisca

 28 de dezembro de 2022 

A chuva dominou os assuntos e as reportagens nos últimos dez dias. Muita gente precisando de ajuda, uns correndo para ajudar, outros se enfurnando em casa para fugir, e outros, ainda, aproveitando-se da desgraça alheia. Sempre temos gente de todo tipo, em qualquer ocasião.

Triste, muito triste, é saber que muitas pessoas, depois de muita luta para conseguir montar sua casa, por mais simples que fosse, ficaram sem nada, porque a água não deu trégua.  Ainda bem que ainda temos cristãos, no sentido amplo da palavra.

Pensando nessa chuvarada, imaginei o dilúvio de que fala o “Genesis”. “As águas subiram cada vez mais sobre a terra, até cobrirem as montanhas mais altas que há debaixo do céu (…) Morreu tudo que tinha sopro de vida…” Segundo o texto bíblico, o dilúvio durou 150 dias. Quando tudo acabou, Deus disse: “Enquanto durar a terra, jamais faltarão semeadura e colheita, frio e calor, verão e inverno, dia e noite”.

Noé, então, saiu da Arca, pisou em terra firme, abençoado por Deus! E com o arco-íris, que marcou a esperança, segundo o texto bíblico!

E Noé foi logo tratando de plantar sua vinha, cuidar da vida.

Voltando ao “hoje”, depois de dias e mais dias chuvosos, sem ver o sol, ele, o Rei, brilhava tanto que a vontade era sair correndo e aproveitar essa beleza de céu, sol e mar.

Quem conseguiu voltar pra casa, depois dessa chuvarada deve estar muito feliz.

Eu vi, por obra de minha caminhada matinal, a alegria dos donos de barracas que vendem de tudo no calçadão.   Arrumando as mercadorias, esperando os fregueses e torcendo para o sol continuar, para que pudessem ganhar o pão de cada dia, naquela luta diária.

E eu, à medida que caminhava, sentia como se tivesse encontrado uma grande amiga que não via há muito tempo. Sorria, sorria, e quem me visse assim diria que viu uma doida, rindo para as paredes, aliás, para o vento.

E prometi que hoje nada iria me perturbar.  Os mal-educados, eu nem iria ver. Os cachorros atrapalhando o caminho, da mesma forma. Pessoas brigando, falando lorotas, nem prestaria atenção.

Mas esse último propósito não vingou por muito tempo. Como teria dito José de Alencar, o cronista é como o colibri, esvoaçando de caule em caule. “Tudo lhe pertence, até mesmo a política”.

Então, já estava olhando para todos os lados, e escutando juízes, críticos literários, advogados, especialistas em política, todos com “muita sabedoria”, dando lições.

Mas nada disso me incomodou, tamanha minha alegria.

Um homem passou como um relâmpago, num skate de duas rodas, um enorme cachorro corria à sua frente, puxando-o. Na pista de ciclista. Fiquei ali olhando aquela beleza e, ao mesmo tempo, imaginando o perigo a que se submetia o homem e os ciclistas.

Daí a pouco, ouvi a notícia da chuva em Belo Horizonte, que estava deixando os moradores sem energia, derrubando árvores, causando alagamentos, enchentes e confusão no trânsito.

Nada é perfeito.  Minha alegria esgarçou-se, para, em seguida, encontrar uma linda criança que me sorriu.

Foi como se eu tivesse visto um arco-íris.

Maria Francisca – dezembro de 2022.

 

 

 

 

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10 comentários

  1. Minha amiga Francisca. De onde vem tanta inspiração? Deve ser o dom da leitura mesmo!Sou fã incondicional seu,não me canso de falar. Parabéns por mais um belo texto.


  2. Geraldo de Castro Pereira
    29 de dezembro de 2022 às 10:14

    Bom dia, prezada confreira Francisca! Linda a sua crônica! Vc. está cada vez melhor em seus escritos! Vc é a nossa nova “Cora Coralina”! Feliz Ano Novo, com muita saúde e literatura!


  3. Sidemberg Rodrigues
    29 de dezembro de 2022 às 10:57

    Lindo e poético texto. Essas chuvas acabam revelando a desigualdade que massacra o Brasil. Vamos ver se alguém pensa em quem precisa para o próximo dilúvio não ser tão seletivo.., Rss o arco-íris é a boa nova depois de tanto cinza. Bem que podia aparecer mais vezes para encher nossos corações de esperança e a internet de crônicas poéticas e bela como está. Beijo carinhoso e parabéns!

    • É. A desigualdade está sempre à mostra. E as enchentes são os principais espelhos. Para quem quer ver, claro. E viva o arco-Iris. Que apareça mais vezes…
      Obrigada, cari amigo.
      Beijo carinhoso.

  4. Que bela Crônica, minha amiga. Só agora pude comentar, mas passei o dia pensando o que disse aqui, mais algumas coisas , antes de ler. Cronista é terrivel conforme mencionou acima, do José de Alencar. Acrescentei às conjecturas as crenças populares: O Tal pote de Ouro, encontrado no fim do arco iris, aiás até cantado naquela maravilhosa música: THE END (At the end of the rainbow you find a pot of gold (mais ou menos, ficar rico sem trabalhar, kkk; A troca de sexo, com quem atravessasse sob ele; e mais um monte de coisas que inventam, além dessa coisa bíblica e daquelas aulas de Física que matavam o nosso romantismo. Mas, Parabéns.

    • Sim, O arco-Iris enseja inúmeras brincadeiras ou crendices. E tem essa bela música, como você fala. Aula de física? Nem quero lembrar. Rsrs.
      O melhor do arco-iris é trazer esperança. Para mim, funciona às mil maravilhas.
      Obrigada pela leitura e comentário.
      Grande abraço,


  5. Leandro Bertoldo Silva
    1 de janeiro de 2023 às 10:22

    Minha amiga, é o que eu considero conseguir enxergar a essência das coisas mesmo nas imperfeições. Que delicadeza e sensibilidade.

    • Obrigada, pelo carinho, leitura e comentário, caro amigo. Como você disse numa crônica: o simples. Ver tudo com olhos de assombro, perceber, sentir.
      Grande abraço.

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Maria Francisca Lacerda
Poeta e escritora.
Espírito Santo - Brasil.


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