Hoje, reli uma crônica muito interessante de Julian Fuks, ECOA, de 16.11.2024 ( Uma palavra sobre as indelicadezas que vamos cometendo pela vida). Ele cita uma tristeza de Cecília Meirelles, por ter cometido uma indelicadeza com a “Velhinha de Florença”, também contada numa linda crônica.
Incrível é que lendo José Saramago em “O Homem Duplicado”, encontro um diálogo em que dois colegas, ambos professores, conversam. O professor de história a pedir desculpas, por ter ficado de cara feira para o de Matemática, simplesmente por ele ter colocado a mão em seu ombro. Sentiu que o colega estava sendo paternalista. Aborreceu-se pensando que o colega estava a dizer que ele precisava de proteção. Ou seja, um gesto singelo e educado foi sentido como ofensa.
Por isso, Diz Fuks: “Lapsos, esquecimentos, faltas, deslizes, cada um sabe de que são feitos os seus sofrimentos. Haverá palavra que redima essas pequenas falhas que vamos cometendo pela vida, distraidamente, sem dolo nem injúria nem indiferença? Não serei o único a caminhar por aí carregando comigo um pedido de perdão impreciso, de termos vagos, sem motivo nem destinatário definido. Talvez sejamos muitos os que perambulamos pelas ruas com um inconfesso espírito de confissão, sem saber bem de qual delito”.
Tudo vai depender do momento, da sensibilidade do interlocutor e, muitas vezes, ficamos sem saber o que dizer, diante de atos ou falhas que cometemos sem querer e, às vezes, nem sabemos que ofendeu o amigo ou conhecido.
Quem me dera se eu pudesse pedir desculpas a todas as pessoas pelas minhas indelicadezas. A vida vai nos levando… e sem perceber, estamos falando uma palavra inadequada para alguém. Falando de um defeito, que pode ser defeito só para nós…
Até um abraço que a pessoa esperava receber de nós e não recebeu pode ser sentido como uma ofensa, ou ter causado tristeza, como me disse uma moça, certo dia, num evento. Eu adoro dar e receber abraços, eu disse. Ela replicou: Por isso minha tristeza. Só eu fiquei sem um abraço, naquele dia. Vamos nos abraçar, então, e dei-lhe um abraço. Pedi desculpas, claro, mas o abraço que ela queria naquela época, não ganhou.
Fiquei com o enigma: Que dia foi esse que neguei um abraço a essa moça? Um abraço, apenas um abraço. Difícil, não?
Mas uma indelicadeza que não tenho como reparar, observei recentemente, quando fui dar sugestões a uma amiga sobre os agradecimentos que ela registraria num livro, resultado de uma pesquisa. Nos agradecimentos do meu livro de mestrado deixei de registrar os títulos de Professor-Doutor de um grande amigo que muito me ajudara. Como era amigo, falei apenas o nome dele. Puxa! Só porque era meu amigo? Acho que a intimidade fez isso e me arrependo tardiamente. Peço desculpas agora? Surtiria efeito?
Então, sou mais uma alma penada, a andar por aí com um pedido de perdão vago, impreciso, sem destinatário definido, como disse Julian Fuks.
Maria Francisca – fevereiro de 2025.