Dizem que os velhos são todos teimosos. E são, mesmo. Eu sou. Mas esses, dessa história que me contaram, passam da medida, como diria minha mãe.
Casados há mais de 60 anos, Mariana e Joaquim viviam numa cidadezinha, aliás, numa Vila, nos confins de Minas Gerais. Não em Confins, onde fica o aeroporto Tancredo Neves, mas num fim de mundo, num cacha prego, talvez um lugar parecido com o do personagem Crisóstomo, de Valter Hugo Mãe. Só não seria à beira-mar, porque, como se sabe, Minas só tem “Mar de Espanha”.
Pois bem. Viviam ali tranquilamente. Dividiam as tarefas domésticas. Saiam só para ir à Igreja, mesmo assim, de manhã. Dormiam cedo, como a maioria dos idosos. Recebiam só a visita dos vizinhos que ali acorriam quando necessário. Não se sabia se tinham parentes, porque nunca se viu alguém por lá.
Num dia muito frio, foram deitar-se mais cedo do que de costume.
Estavam quase dormindo, quando Mariana lembrou-se: Joaquim, você fechou aporta? Eu não, respondeu. Então vá fechar, porque ficou aberta. Com esse frio? Vá você, Mariana. Não. Vá você.
E assim ficaram teimando, teimando, até que resolveram: Vamos fazer uma aposta: Quem conversar primeiro fecha a porta. E silenciaram, cada um vigiando o outro.
O tempo passava, nenhum falava… e a porta esperando.
Já bem tarde, os vizinhos voltavam da festa junina e repararam a porta aberta. Assustaram-se. Ainda mais tudo escuro.
Pé ante pé, foram entrando na casa e sentindo aquele silêncio soturno, até chegarem ao quarto do casal e darem com eles ali quietinhos. Será que estão mortos? Com muito medo, acenderam as luzes e viram que estavam vivos. Falaram alto, chamaram-nos pelos nomes, gritaram…Silêncio. Atônitos, mandaram um mensageiro, correndo, chamar o médico, que veio afoito, já trazendo toda a parafernália de que dispunha em casa, como único médico daquela Vila.
Ausculta-os, apalpa aqui, apalpa acolá… olha a pressão, olha a temperatura e nada encontra. Nessa altura, a vila toda já estava por ali: uns por curiosidade, outros para ajudar e outros por nada. O médico, então, falou com a vizinha que o havia chamado: Vai ser o jeito dar uma injeção de “5 HTP”. Quem sabe eles acordam?
Preparou a injeção e pensou alto: Em quem aplico primeiro? Joaquim, que morria de medo de injeção, deu um pulo e gritou: NELA! Ela sentou-se na cama, deu boa noite a todos, na maior tranquilidade, e disse: Viu? Não adiantou nada. Vai ter que fechar a porta.
E silenciaram. Por mais que perguntassem o que houve, nem Seu Joaquim, nem Dona Mariana responderam. Nem ao médico quiseram responder. Ou melhor, deram de calado a resposta, como diria uma amiga.
Então, foram todos saindo decepcionados e silentes. E imagino mais: com uma raiva danada daqueles velhos teimosos.
Até hoje, naquela Vila, agora cidade, mesmo tendo uma rua só, como muitas em MG, comenta-se essa história que, de tanto ser contata, tem-se por verdadeira.
Geraldo de Castro Pereira
18 de junho de 2018 às 17:34
Legal! Adorei o seu texto. Continue nos brindando com suas histórias ou “estórias”. Parabéns!
mariafrancisca
27 de junho de 2018 às 17:15
Obrigada, Alda. Você está sempre me prestigiando. Beijos.
mariafrancisca
27 de junho de 2018 às 17:15
Grata, Geraldo. Um abraço.
Alda
19 de junho de 2018 às 13:19
?????? É assim que se conta um causo
??????????
Arildo de Jesus
19 de junho de 2018 às 17:24
Francisca,
Vania, de vez em quando, faz isso comigo: Arildo, a porta está fechada? Eu acho bom propor uma aposta !
mariafrancisca
27 de junho de 2018 às 17:14
Aqui também tem dessas apostas, Arildo…Rsrs. Fale com Vania. Grande abraço.